publicado dia 10/10/2016
10/10/2016|
Por Ana Luísa Vieira
“Tudo o que não invento é falso.” A frase é de Manoel de Barros (1916-2014), querido poeta brasileiro. Está lá em seu livro “Memórias Inventadas”. E está aqui no comecinho desta prosa para temperar a ideia sobre a importância da literatura no acolhimento de uma criança já nos seus primeiros anos de vida; sobre o valor de ser semeada juntamente com outras ofertas, outros cuidados. “Lembrem-se que bebês leem com os ouvidos e que os adultos são o texto deles por excelência”, diz Yolanda Reyes, autora colombiana que fundou um lugar muito especial e acolhedor chamado “Espantapajaros”, em Bogotá, que se ocupa da formação do leitor literário desde a mais tenra idade.
“Tudo o que existe no mundo passou antes pela imaginação de alguém”, dizia o saudoso poeta mineiro Bartolomeu Campos de Queiros. Ora, do que estamos falando quando falamos de oferecer arte literária? Falamos de construção de humanidades, de acolhimento ao novo que chega para somar e compor às redes de cuidados com a vida em sua infinita diversidade. Semear a percepção de que, sim, pertencemos a uma humanidade comum e acolhemos o novo bom e melhor.
Oferecendo literatura para que experimente e entenda a linguagem como meio de apropriar-se do mundo e da experiência literária como “lugar” que nos acolhe para além do burburinho de todas as mídias e suas mensagens superficiais e tantas vezes raivosas, impregnadas de preconceitos, onde a vida é apresentada fatiada e de forma funcionária. A literatura acolhe em seu colo a nova vida que nasce com abertura para a escuta e para o diálogo. É essa a mensagem que comunicamos como cuidadores; a vida, sem estereótipos.
Com a literatura, os verbos ser e estar são conjugados em suas infinitas possibilidades! E isso é muito, muito importante para acordar a consciência de que diversidade é a tônica da vida, assim como dela fazem parte o sonho, o medo, a frustração, a raiva, a contradição. O ir e vir. E também o amor, o encantamento, a esperança, a coragem, a indignação, que nos movem adiante em busca de habilidades e caminhos para inventar e pôr de pé o mundo que a gente quer, igualmente bom e justo para todos. Um lugar onde a infância é cuidada, porque sabe-se que é o tempo inaugural da vida, e a vida precisa de tempo e cuidado.
“…Eu aprendera que as imagens com palavras eram para se ver de ouvir”, escreve Manoel de Barros. As crianças se tornam leitoras literalmente no colo dos pais, mesmo que estes não saibam ler ou tenham dificuldades de leitura. É sobre os muitos meios de cultivar cultura de leitura literária em casa trata o passaporte da leitura brincar de ler. Mais tarde, na escola, professores dão sequência à sua trajetória leitora. Por isso são tão fundamentais as bibliotecas abertas à comunidade em todos os cantos do País: bibliotecas a mãos cheia para oferecerem livros gratuitamente a mãos cheia e leituras alimentadoras, que acordam humanidades, como anuncia Bartolomeu:
“De tudo nos fica a certeza de que é necessário – mais que nunca – educar os nossos sentidos. Só depois de bem apurados seremos capazes de nomear com mais significantes o mundo, que nos recebe para a vida e que estará, sempre, antes e depois de nós. E não há método mais eficaz do que a palavra literária para acordar e atribuir sentidos às coisas. É preciso aprender a contemplar as sementes e deixar a palavra dizer a árvore que ela protege em seu dentro”.
12 de outubro é o Dia Nacional da Leitura.
Isso mesmo! No Dia da Criança. A inclusão deste dia no calendário nacional foi pensada e buscada por gente que sabe que devemos ter em nós “todos os sonhos do mundo”, como escreveu o poeta Fernando Pessoa. Então, dê leituras de literatura de presente, porque isso pode afetar positivamente a vida de uma criança e o nosso futuro, letra por letra, Brasil adentro, mundo afora!