publicado dia 01/02/2017
01/02/2017|
Por Ana Luísa Vieira
Em 2014, fui escolhido pela ministra Ideli Salvatti como integrante do governo federal para acompanhar a missão da CPI da Exploração Sexual em Coari, no estado do Amazonas. Trabalhei de 2011 a 2016 na Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República como coordenador-geral da política de fortalecimento de Conselhos.
Em Coari, durante todo o dia, ouvi relatos tristes de pais e mães que tiveram suas filhas violentadas, vítimas de abuso e exploração sexual pelo prefeito Adail Pinheiro e seus assessores, que atuavam na cidade como aliciadores. Um cenário de horror e dor.
No dia 24 de fevereiro de 2016, o juiz Luís Carlos Valois determinou a extinção da pena de Adail Pinheiro e a expedição do alvará de soltura, baseado em um decreto do presidente Michel Temer (Decreto Presidencial n° 8.940/16, de 22 de dezembro de 2016) ,que concede o perdão da pena “nos crimes praticados sem grave ameaça ou violência à pessoa, quando a pena privativa de liberdade não for superior a 12 anos, desde que tenha sido cumprido um quarto da pena, se não reincidentes, ou um terço, se reincidentes”.
Adail Pinheiro foi condenado, em outubro de 2014, a 11 anos e 10 meses de prisão pelos “crimes de favorecimento à prostituição, indução à satisfação de impulsos sexuais e por submeter crianças e adolescentes à prostituição ou à exploração sexual”.
Mesmo com a pena suspensa, seus advogados ainda vão tentar nos tribunais superiores provar que ele não cometeu os crimes e foi vítima de armação política. A Secretaria Especial de Direitos Humanos, atualmente vinculada ao Ministério da Justiça, avalia pedir que seja revista a extinção da pena.
E agora? Como ficam as crianças e adolescentes que tiveram infância e inocência roubadas pelo ex-prefeito? Como Adail Pinheiro pode sair da prisão pela porta da frente, com sua pena extinta? Vale lembrar que ele aguarda pelo julgamento de outros 44 processos.
Adail Pinheiro, o homem poderoso de Coari, mais uma vez prova sua força. Ao longo do breve período em que esteve preso, descumpriu regras e, mesmo assim, teve o perdão. É um homem livre.
O atual prefeito de Coari é o filho de Adail Pinheiro, eleito em outubro de 2016. Ele tem anunciado que nomeará o pai como secretário municipal de obras, a principal pasta do município, responsável por concentrar a maior parte do orçamento.
Com o agente violador de volta à cidade, como ficam as crianças, os adolescentes e suas famílias que denunciaram e provaram os crimes cometidos pelo ex-prefeito? Que o Tribunal de Justiça do estado do Amazonas e o Conselho Nacional de Justiça possam, imediatamente, rever esta decisão.
Do contrário, continuará valendo a máxima segundo a qual o crime compensa. Não se pode permitir que a impunidade, associada ao poder econômico, continue fazendo a roda girar.
Eu vi o choro de um pai em Coari, a dor expressada em suas palavras… Que o Congresso Nacional transforme os artigos 228 e 229 do Código Penal e 224 A do Estatuto da Criança e do Adolescente em crime hediondo. Assim, criminosos que usurpam a infância não poderão mais se ver livres de cumprir as penas decorrentes de seus atos e condutas contra crianças e adolescentes.
Eu e milhares de brasileiros, defensores dos direitos de crianças e adolescentes, choramos juntos com as meninas vítimas de um agressor feroz e poderoso.