20/12/2017|
O coordenador da Comissão da Criança e do Adolescente do Condepe (Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana), Ariel de Castro Alves, encaminhou, na quinta-feira 19 de dezembro à promotoria da infância e juventude do Ministério Público do Estado de São Paulo uma representação urgente.
Trata-se da falta de políticas públicas, incluindo programas e serviços sociais, voltados a crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social que vivem no centro de São Paulo – principalmente às crianças e aos adolescentes em situação de rua.
Na representação, o advogado cita os resultados do recente relatório divulgado pela ONG Visão Mundial, incluindo a informação de que atualmente 895 crianças e adolescentes estão vivendo nas ruas do Centro de São Paulo.
De acordo com dados revelados pela ONG, 77.290 crianças e adolescentes da cidade de São Paulo estão em situação de riscos (abusos, negligências e explorações). Na representação outros números da pesquisa da entidade ainda são mencionados, explica o especialista, também parceiro da Rede Peteca – Chega de Trabalho Infantil:
Entre os dados referentes à crianças de 2 a 6 anos, devemos destacar que 29% disseram que se alimentavam nas ruas e entre os locais que as crianças disseram que gostavam de ficar, 51% mencionaram as ruas.
Concluiu-se que 51% das crianças nesta faixa etária estão em situação de extrema violação de direitos. Já na faixa etária de 7 a 11 anos se destaca o fato de 19% delas afirmarem que dormem com fome e que 37% delas sofrem alguma violência, sendo que 70% são vítimas de violência doméstica.
Além disso, 40% afirmaram que são responsáveis pelos irmãos mais novos em casa, denotando a existência do trabalho infantil doméstico, além do abandono e negligência. Entre os adolescentes de 12 a 17 anos, devemos destacar que 49% apresentaram distorção entre idade e série (defasagem escolar) e que 4% estavam fora da escola. Também 50% dos entrevistados mostraram média expectativa de vida e 16% mostraram baixas perspectivas e expectativas de vida.
22% disseram que identificam que estão em situação de risco, sendo que 68% se referem a riscos das condições comunitárias e das ações repressoras do estado (polícia), 21% atribuem a fatores do ambiente familiar (moradia, maus-tratos e violência doméstica) e 11% atribuem esses riscos a problemas de insegurança pública e drogas. 31% dos adolescentes afirmaram que cuidam dos irmãos mais novos.
Quanto ao uso de drogas, 3,8% usam maconha, 3,8% usam cigarros e 25% já usaram álcool algumas vezes, sendo que 29% disseram acessar drogas por meio de amigos e 8% acessam por meio de parentes e na própria casa. 13% já tiveram envolvimento com atos infracionais. 19% disseram que trabalham informalmente, principalmente como vendedores nas ruas, ou como ajudantes em lojas e lanchonetes. Entre todos os entrevistados, 22% vivem em ocupações no Centro de São Paulo e 37% vivem em famílias com renda familiar inferior a 1 salário mínimo. 33% dos adolescentes já presenciaram o uso de drogas dentro de suas casas.
Quanto às crianças e adolescentes em situação de rua, foram entrevistadas 22 crianças e adolescentes na Sé, Vale do Anhangabaú e na Cracolândia. 59% estavam na região da Sé, 64% estavam consumindo drogas no momento da entrevista, principalmente thinner e crack; 27% disseram que dormiam diariamente na rua e 41% afirmaram que dormiam alguns dias em casa e outros na rua. 41% dos entrevistados também disseram que não estavam mais frequentando a escola. 32% afirmaram que já tinham passado pela Fundação Casa (internação).
Leitura dos dados
Analisando os dados da pesquisa, o advogado conclui que a pesquisa demonstra numericamente e exemplificativamente o que está cada vez mais visível para quem frequenta as ruas do centro de São Paulo.
“Diante da divulgação da pesquisa, a Prefeitura Municipal se quer se pronunciou para apresentar suas atuais ações ou mesmo projetos futuros diante da grave situação dos meninos e meninas que vivem na região central de São Paulo, principalmente daqueles que estão em situação de rua. Inclusive, devemos destacar que as ruas da região central são frequentadas pelas principais autoridades do Governo do Estado, da Prefeitura Municipal, do Judiciário e do Ministério Público Paulista, além de representantes do empresariado, mas apesar desses olhares de observadores qualificados de poder e também de prestígios políticos e econômicos, nada tem sido feito efetivamente diante do completo abandono dessas crianças e adolescentes”, comenta o especialista.
De fato, afirma Alves, tem aumentado consideravelmente a população de crianças e adolescentes nas ruas da região central. “E podemos constatar que crianças cada vez mais novas, algumas de 5, 6, 7 anos em diante, perambulam sozinhas pelas ruas. Podemos ainda verificar concentrações de crianças e adolescentes, em grupos de 10 a 30 jovens, na Rua Anchieta, em frente ao prédio da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), ao lado dos Prédios do Tribunal de Justiça e da Secretaria de Estado da Justiça; e no Anhangabaú, embaixo do Viaduto do Chá, ao lado da sede da Prefeitura Municipal, entre outros locais. Em alguns casos também temos famílias inteiras vivendo nas ruas, incluindo crianças de tenra idade.”
Ele ainda escreve na representação que “é notória a ausência, a negligência e a omissão do Poder Público. Em períodos de férias escolares é possível que a situação se agrave ainda mais.”
Com base na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e nas diretrizes nacionais para o atendimento de crianças e adolescentes em situação de rua, aprovadas em agosto deste ano pelo Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) e pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), o especialista pede que o Ministério Público promova Inquérito Civil e Ação Civil Pública com o objetivo de cobrar da Prefeitura Municipal a implementação de programas e serviços de busca ativa, abordagem, educação social de rua e encaminhamentos dos jovens para serviços especializados de acolhimento (abrigos), para Centros de Referências para Crianças e Adolescentes em Situação de Rua, para programas de atendimentos das famílias e para serviços voltados ao tratamento das crianças e adolescentes usuários e dependentes de drogas, e demais programas sociais, educacionais e de saúde pública.