05/10/2016|
Por Bruna Ribeiro
O Procurador do Trabalho na Paraíba Eduardo Varandas é um dos importantes personagens da história do combate à exploração sexual infantojuvenil. Graças a ele, a luta avançou mais um capítulo, em maio de 2016. Pela primeira vez, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) entendeu que a Justiça do Trabalho é competente para julgar tudo o que estiver ligado à exploração sexual da criança e do adolescente. A decisão é resultado do trabalho de quase dez anos de Varandas, que em 2007 foi o primeiro procurador do Trabalho a mover uma ação civil pública, no âmbito do Ministério Público do Trabalho (MPT), em caso de exploração sexual infantojuvenil.
Com isso, os pedidos de indenizações decorrentes dos danos sofridos por meninos e meninas explorados sexualmente devem tramitar na Justiça do Trabalho e serem investigados também pelo MPT – uma vez que a atividade é considerada uma das piores formas pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Desta maneira, a punição vai além da esfera criminal e visa ressarcir a sociedade, indenizando-a por dano moral coletivo e revertendo as multas para os próprios fundos de infância e adolescência. Segundo o procurador, as consequências da exploração sexual infantil não devem ser analisadas apenas na esfera criminal, pois deixam duras marcas na vida das crianças, das famílias e da comunidade.
A militância no combate à exploração infantil e também ao trabalho escravo rendeu a Varandas reconhecimento internacional, sendo citado pelo jornal americano The New York Times e pela revista europeia Focus. Ele também foi convidado a debater o tema em países como França, Inglaterra e Suíça.
“No caso da Inglaterra, ONGs sugeriram uma conversa com parlamentares para proteção coletiva, da mesma forma que temos aqui. Aqui no Brasil, eu adotei a lei da ação civil pública e especifiquei a ação com o Estatuto da Criança e do Adolescente, além da própria Constituição, que determina a prioridade absoluta de crianças e adolescentes”, explica o procurador.
Ele acredita que o país evoluiu em jurisprudência, pois muitos aguardavam o posicionamento do TST para mover ações desta natureza. “Embora para mim isso sempre tenha sido óbvio, nunca havia sido falado. Foi aberto um novo capitulo em questão de punibilidade contra delitos praticados contra criança e adolescente, também na responsabilidade patrimonial, além da criminal. Apesar disso, a exploração sexual infantil continua acontecendo a céu aberto. É algo visível e dolosamente ignorado pelas autoridades”, comenta Varandas.
O procurador acredita que as políticas públicas ainda são os aspectos mais importantes da luta. “É preciso haver fortalecimento da escola pública, campanhas de conscientização e assistência a famílias abaixo da linha da pobreza. Neste ponto, avançamos pouco. Sempre tivemos uma postura deficiente no que se refere à proteção da criança e do adolescente. Não adianta o Ministério Publico ou o poder judiciário punirem os culpados, se o Estado não se preocupa em dar à criança e ao adolescente toda a gama de direitos garantida pela Constituição.”
Entenda o caso
Em 2007, um escândalo abalou a pequena cidade de Sapé, na Paraíba. Onze homens influentes da cidade, entre políticos e empresários, exploravam sexualmente crianças e adolescentes. “Do motel, eles ligavam para uma cafetina, que mandava motoboys buscarem meninas nas comunidades humildes da cidade, entregando-as como mercadorias”, conta Varandas.
A história motivou o procurador a abrir a primeira ação civil pública, pedindo a aplicação de multa no valor de R$ 500 mil para cada envolvido, como forma de indenização à sociedade daquela cidade por dano moral coletivo.
A batalha foi árdua. A primeira instância, na Vara do Trabalho de Santa Rita, também na Paraíba, declarou a incompetência da Justiça do Trabalho, entendendo que não era uma questão de trabalho, mas de consumo. “Isso subverte todos os princípios, não apenas do trabalho, mas também da criança e do adolescente, colocando a menina explorada como fornecedora de sexo e os abusadores no lugar de consumidores. Na época, houve inclusive protesto no Congresso Nacional a respeito da decisão.”
Após recorrer, a sentença foi anulada, mas a instância seguinte julgou improcedente o pedido do Ministério Público. Após recorrer mais uma vez, o Tribunal do Trabalho, em uma sessão de quatro horas, acolheu o entendimento do Ministério Público, condenando os envolvidos. Somente em 2016 o Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve integralmente a condenação, entendendo que a Justiça do Trabalho é competente para julgar tudo o que estiver ligado à exploração sexual da criança e do adolescente, já que a exploração sexual infantil é uma das piores formas de trabalho infantil.