15/02/2017|
Por Bruna Ribeiro
Em um país de proporções continentais, o trabalho infantil muitas vezes pode não ser tão óbvio. Está escondido nas entranhas de nossos interiores. Apresentado em maio de 2016, o Projeto de Lei (PL) 5162/2016, do deputado Pepe Vargas (PT-RS), propõe chegar a esses lugares, para que as crianças e adolescentes deixem de ser exploradas e passem à condição de aprendizes do campo.
Em tramitação na Câmara dos Deputados, a proposta seguirá para Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e, se aprovada, vai para votação no Senado.
A Lei do Aprendiz já exige a destinação de 5% a 15% de suas vagas para jovens. O deputado Pepe Vargas explica que a intenção é adaptá-la à realidade rural. “A ideia é modificá-la, para abranger também os alunos das escolas do campo, que adotam a pedagogia da alternância”, diz Vargas.
Segundo ele, o objetivo do programa é incentivar os estudantes a se qualificarem e permanecerem em suas cidades, diminuindo o êxodo rural. “As cooperativas da agricultura familiar, por exemplo, podem ensiná-los a serem agricultores e também gestores agroindustriais”.
Ainda de acordo com Vargas, dos 5,1 milhões de estabelecimentos rurais do Brasil, 84% são compostos por agricultores familiares. A aprendizagem por meio de cooperativas fortaleceria a sucessão rural. A importância dessa prática tem relação direta com a economia, pois 70% de alimentos consumidos na mesa do brasileiro são produzidos em propriedades familiares.
Na outra ponta, o agronegócio se dedica às commodities para exportação, em escala empresarial. “Precisamos fortalecer e capacitar o jovem agricultor, aumentando sua renda e agregando valor aos seus produtos.”
Quando os alunos e famílias compreendem a importância dos estudos na vida prática, há o aumento do grau de escolarização e o rompimento do ciclo da pobreza. Para o deputado, quando isso ocorre em uma escola que também ensina atividades agrícolas, os jovens saem mais preparados para a realidade onde vivem.
“Os conhecimentos passados de pais para filhos na agricultura são bons, mas insuficientes para aumentar a renda da propriedade familiar. É importante a escola estar adaptada à realidade. Caso contrário, incentivamos o êxodo rural.”
Escola Família Agrícola
Buscando a adequação da escola à vida do campo, a Escola Família Agrícola (EFA) utiliza a pedagogia da alternância. O método foi criado na França, em 1935, proporcionando conhecimentos gerais e técnicos voltados para a realidade rural, além do exercício dos conhecimentos recebidos na prática.
No Brasil, apenas em 2013 a Resolução nº 32/2013 do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Professionais da Educação (Fundeb) determinou o repasse de verba às Escolas Família Agrícola. “Como o município recebe recursos de acordo com o Censo Escolar, os alunos de escolas do campo não eram contados, mas conseguimos mudar essa situação para o recurso chegar a essas escolas”, explica o deputado.
Para Vargas, todas as escolas públicas desse perfil deveriam voltar os olhos às reais necessidades do jovem que não vive na cidade, adotando o mesmo método e protegendo os adolescentes, ao conciliar estudo e trabalho na zona rural, por meio da Lei do Aprendiz.
Números
Os números da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) 2015 evidenciam a importância de olharmos para o campo. Dos 2,6 milhões de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos em situação de trabalho, 32% realizam atividades agrícolas. Quando fazemos o recorte de 5 a 14 anos, há um aumento nas estatísticas. Em 2014, eram 55,6%. Em 2015, o número foi para 56,5%.
Heloísa Oliveira, administradora executiva da Fundação Abrinq, acredita que o trabalho infantil no meio rural traz importantes desafios para sua erradicação, por ser uma prática cultural.
“É preciso encontrar caminhos para combater este problema. Por isso sou totalmente favorável ao projeto de lei”, opina Heloísa, que acompanha a agenda legislativa brasileira pelo Observatório da Criança e do Adolescente, iniciativa da mesma instituição.