04/12/2019|
Por Bruna Ribeiro
Na tarde de terça (3), entidades da sociedade civil, movimentos sociais, militantes e órgãos de Estado se reuniram no Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana do Estado de São Paulo (Condepe), para acompanhar as apurações do Massacre de Paraisópolis, na zona sul de São Paulo. A presença de Daniel, irmão da vítima Denys Henrique Quirino da Silva, de 16 anos, emocionou os presentes.
O encontro levou mais de cem pessoas ao prédio do conselho no centro de São Paulo (SP), que deliberaram diversos encaminhamentos. Os principais são a organização de agenda dos atos e atividades para mobilização permanente, a partir da criação de um mailing com as entidades presentes para divulgação e troca de informações; a constituição de um comitê “Massacre Nunca Mais“, para acompanhamento das ações de mobilização e investigação do massacre; a constituição de grupo de advogados para acompanhamento das medidas judiciais e a definição de uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, no próximo dia 11.
Logo no início do evento, uma mesa – coordenada pelo presidente do Condepe Dimitri Sales – foi composta por Margarete Pedroso, representante da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a deputada estadual Beth Sahão (PT), a vice-presidente do Condepe Graça Xavier, o ouvidor da Polícia Benedito Mariano e Rafael Lessa, coordenador de Direitos Humanos da Defensoria Pública do Estado de São Paulo.
Declarações
Cada integrante da mesa teve direito à fala, onde foram apresentadas as medidas que estão sendo tomadas pelos órgãos representados. Segundo o presidente do Condepe Dimitri Sales, o conselho entende que a versão apresentada pela polícia e pela Secretaria de Segurança Pública são insuficientes para justificar o ocorrido.
De acordo com Sales, segundo informações da Polícia Militar (PM), o ato se deu porque duas motos furaram o bloqueio da polícia. “Queremos informações sobre o bloqueio. Quem comandou? Quais policiais? Quais foram os documentos preparatórios e resultados obtidos dessa operação?”, questiona. “Queremos saber se a operação existiu, porque se não existiu, cai por terra o argumento da polícia.”
Além disso, o presidente do Condepe informou que das nove pessoas que morreram, sete morreram no local. Segundo ele, o corpos não poderiam ter sido deslocados para o hospital, para que a polícia científica tivesse realizado a perícia corretamente.
“Também recebemos a informação de que o Instituto Médico Legal (IML) não estava fotografando os corpos, mas fomos impedidos de realizar uma investigação in loco da denúncia, por mais que tenhamos o direito à inspeção, garantido por lei”, disse.
O Condepe também encaminhou um ofício à Secretaria de Segurança Pública para esclarecer informações, como a denúncia de que os moradores teriam sido impedidos de prestar os primeiros socorros às vítimas e ameaçados por isso.
Margarete Pedroso, representante do Conselho de Direitos Humanos da OAB, disse que o massacre é fruto do genocídio negro da população periférica, além da criminalização da cultura do funk e da periferia. “É importante darmos nomes às coisas para que a sociedade acompanhe os fatos.”
Para a deputada estadual Beth Sahão, o governo do Estado deve ser responsabilizado pela recorrente ação truculenta da PM “Isso tudo tem um comando. É um conceito vindo do governo, que deve ser responsabilizado, assim como a Secretaria de Segurança Pública e os policiais. Os pancadões precisam ser regularizados, sim, mas precisam existir, porque é a única forma de diversão da juventude pobre e negra”, encerrou.
Segundo ouvidor da polícia Benedito Mariano, foi solicitado que a investigação sobre a ocorrência seja alocada no órgão corregedor. “Infelizmente 97% das ocorrências graves, sobretudo as que envolvem mortes em decorrência de intervenções, são investigadas pelo batalhão de origem dos policiais envolvidos. O órgão corregedor investiga apenas 3%. Temos destacado isso e encaminhado ao governo, pois queremos investigar todas as ocorrências que envolvem mortes de civis”, disse Mariano.
Ainda de acordo com o ouvidor, estão sendo analisados os protocolos que a própria PM adota com relação ao controle de distúrbio. “A orientação é que nunca seja feita uma intervenção como essa em um evento de 5 mil pessoas. Nossa avaliação é que a ocorrência foi improvisada, precipitada e que dialoga com o resultado da tragédia.”
Por fim, o defensor público Rafael Lessa disse que a defensoria recebe constantemente denúncias de repressão policial em Paraisópolis e outras periferias, como Heliópolis e Grajaú. “Existe uma omissão do poder público em relação à promoção da cultura do jovem. Que política pública é essa que não consegue acolher 5 mil jovens dentro do seus equipamentos de cultura?”
Ainda segundo Lessa, a defensoria começou a atender os familiares das vítimas mortas e disponibilizou atendimento a domicílio, além de um plantão em Paraisópolis para atender outros casos, como pessoas machucadas e que sofreram qualquer tipo de dano.