24/11/2016|
Por Cecilia Garcia
O Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA) publicou no Diário Oficial da Cidade de São Paulo, nesta quinta-feira (24 de novembro), uma nota de repúdio à possível aprovação do Projeto de Lei 7.553/2014.
De autoria do deputado Marcos Rogério (DEM-RO), a proposta permitiria a divulgação de imagens, fotografias e informações de crianças e adolescentes que tenham cometido atos infracionais considerados graves, com privação de liberdade de igual ou maior a dois anos.
Na nota (confira a íntegra no quadro abaixo), o CMDCA demonstra preocupação pelo direito de preservação de imagens dos sujeitos de direitos, maiores vítimas da deficiência das políticas públicas de segurança no Brasil.
O Projeto de Lei revoga o artigo 247 do Estatuto da Criança e da Adolescente (ECA), que tipifica como infração administrativa o ato de “divulgar, total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial relativo à criança ou adolescente a que se atribua ato infracional”.
Segundo o Observatório da Criança e do Adolescente, o autor da PL alega a divulgação é fundamental para identificação e “revelação do delinquente para os fins de persecução criminal”.
Contramão dos direitos humanos
A exposição, antes mesmo da apuração dos fatos e seu devido processamento legal, aumenta as chances de discriminação, agressões físicas ou pré-julgamentos por uma opinião pública já fortemente influenciada pela brutalidade midiática.
O artigo 17 do ECA é claro: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”.
Ainda segundo o ECA, e também com base no artigo 277 da Constituição Federal, as crianças e adolescentes brasileiros têm direito à proteção integral e absoluta nas políticas públicas, ações sociais e de governo como sujeitos de direito.
Para o Conselho Municipal, o Projeto de Lei não faz senão adicionar à lista mais um ataque aos vulneráveis em um cenário político já propício para graves violações de direitos – como a discussão da redução da maioridade penal. “O projeto justificado pela necessidade de segurança é uma falácia, pois não são os jovens e muito menos as crianças os agentes da insegurança no país”, diz a nota de repúdio.
A importância da ressocialização
Ainda em nota, o Conselho reafirma sua preocupação com relação a uma política de marginalização e não de ressocialização do grupo socialmente excluído de adolescentes em conflito com a lei. São eles os maiores vitimados pela violência de Estado, e é dever do poder público assegurar que uma vez responsáveis por infrações, eles jovens por medidas socioeducativas que não o excluam – e sim o façam se reintegrar na sociedade.
A proposição do Projeto de Lei está pronta para pauta na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática. Acompanhe o andamento da pauta pela Rede Peteca – Chega de Trabalho Infantil.
Nota de repúdio
CONSELHO MUNICIPAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
PUBLICAÇÃO Nº 312/CMDCA/SP/2016
O Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo – CMDCA no uso das atribuições que lhe são conferidas pela Lei 8.069/90- ECA, comunica nota pública em defesa do direito de proteção à imagem de crianças e adolescentes.
NOTA PÚBLICA DO CONSELHO MUNICIPAL DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DE SÃO PAULO EM DEFESA DO DIREITO DE PROTEÇÃO À IMAGEM DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
O Conselho Municipal de Defesa dos Direitos da Crianças e do Adolescente de São Paulo (CMDCA-SP), reunido em 21 de novembro de 2016, vem, por meio desta nota, manifestar publicamente sua preocupação com a possível aprovação do Projeto de Lei nº 7.553 de 2014, de autoria do Deputado Federal Marcos Rogério. O Projeto de Lei, permitirá a identificação de crianças e adolescentes mediante a divulgação das imagens de seus rostos. Esta proposta fere o artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal, além de infringir o preceito do artigo 17 do ECA: “O direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais.”. As crianças e adolescentes brasileiras gozam da proteção integral e tem prioridade absoluta nas políticas públicas, ações sociais e de governo, conforme artigos 1º e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente e de acordo com o artigo 277 da Constituição Federal.
Além disso, contraria a lógica do Sistema de Garantia de Direitos, construída cuidadosa e responsavelmente por atores da sociedade civil e pelo Poder Público nas últimas décadas.
O projeto justificado pela necessidade de segurança é uma falácia, pois não são os jovens e muito menos as crianças os agentes da insegurança no país. O projeto é tão somente um ataque aos mais vulneráveis. Verifica-se que no caso do adolescente que comete ato infracional o mesmo não possui condições de observar as consequências de seus atos em sua vida e para a sociedade. A exposição pública da criança ou adolescente será mais um motivo para discriminação moral, agressões físicas e para prévio julgamento pela opinião pública antes mesmo da devida apuração dos fatos e seu devido processamento legal.
Essa exposição, uma vez chancelada pelo Estado, aumentará ainda mais a repulsa da sociedade em relação a esses sujeitos de direitos, e em nada contribuirá no caso de adolescentes infratores para sua ressocialização. Tal medida, portanto, não garantirá o aumento da segurança pública, mas apenas intensificará a marginalização de um grupo socialmente excluído.
O referido projeto, se aprovado, poderá causar danos irreparáveis na vida desses sujeitos em desenvolvimento, prejudicando o objetivo de ressocialização que fundamenta a aplicação de medidas socioeducativas.
Frente à gravidade desta medida e considerando o atual contexto político de naturalização das violações de direitos, o CMDCA-SP expressa seu repúdio ao Projeto de Lei nº 7.553 de 2014, posicionando-se em defesa da proteção e garantia dos direitos das crianças e adolescentes e reafirmando seu compromisso de garantir que as crianças e adolescentes tenham cada vez mais oportunidades e condições de tornarem-se cidadãos e, consequentemente, serem parte da sociedade brasileira como futuros agentes de transformação.
CONSELHO MUNICIPAL DE DEFESA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE DE SÃO PAULO
Fonte: Diário Oficial da Cidade de São Paulo – quinta-feira, 24 de novembro de 2016