publicado dia 28/05/2021

Sala de leitura que transforma

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28/05/2021|

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Professora ajuda a combater preconceitos, promover a diversidade e fortalecer a autoestima das crianças negras por meio da literatura

Por Diel Santos

É dentro da sala de leitura que nasce o projeto Lê Comigo, criado pela professora Ana Soares (Anamô), da escola municipal de educação infantil Dom João VI, no Rio de Janeiro. Há 10 anos, a docente promove nas crianças a paixão pela literatura e tem focado, também, no impacto do universo dos livros na vida de crianças negras e na redução de preconceitos. “Logo que assumi a sala de leitura, queria transformar o espaço em um local alegre, vivo, atrativo, com acesso facilitado e capaz de promover a felicidade nas crianças da escola”, conta a professora. 

Realizado durante todo o ano, o projeto se tornou um importante movimento de valorização da literatura dentro da escola a partir da contação de histórias. Além disso, tem a Lei 10.639/03, que estabelece o ensino da cultura africana e afro-brasileira nas escolas de educação básica do país, um pilar da iniciativa.

“É importante que a literatura infantil africana e afro-brasileira cruze todos as etapas de ensino e durante o ano inteiro. Os livros ajudam a quebrar com padrões estéticos, de beleza e estereótipos racistas. O projeto inclui a lei de forma muita séria”, comenta a professora.

A iniciativa Lê Comigo rendeu à professora Ana Soares o Prêmio Paulo Freire da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro como destaque por ações motivadoras na educação do país. Além disso, ela foi finalista do Prêmio Educador Nota 10.

Como funciona o projeto

Até 2019, quando as aulas ocorriam de forma presencial, o projeto pedagógico acontecia dentro da sala de leitura. Há um cronograma semanal com diversas atividades que auxiliam as crianças a conhecerem a leitura a partir de cinco maneiras: autônoma, silenciosa, compartilhada, contação de histórias e na interação com o cinema. “São dinâmicas diferentes, mas todas pensadas na interação e na possibilidade de o próprio aluno construir suas experiências pela leitura”, explica Ana Soares.

A maior parte dos livros trabalhados com as crianças da Educação Infantil da escola são de autores negros, como Sonia Rosa, Kiusam de Oliveira, Júlio Emílio Braz e Lázaro Ramos, entro outros. “As crianças, principalmente as negras, se veem representados nessa literatura. Os livros falam de cabelo, religiosidade, sonhos, capoeiras e muitas coisas que fazem parte da vida delas. Essa representatividade é essencial”, comenta. 

A professora também promove o encontro entre as crianças com autores, contadores de histórias e artistas de outras áreas. “Receber convidados das artes literárias é nossa expertise”, brinca. Os convidados são apresentados às gibideiras criadas pelas crianças, à sala de leitura e compartilham momentos literários juntos com as crianças.

As gibideiras, outra ação do projeto, são geladeiras de livros e gibis, que ficam espalhadas pela escola e foram customizadas pelas crianças. Elas guardam obras de literatura, histórias de heróis, gibis, entre outros. “Essas gibideiras tiram a burocracia do acesso ao livro. Em muitas escolas, emprestar um livro é um grande evento, precisa carimbar, registrar, assinar. Tudo isso atrapalha demais”, comenta. Segundo a professora, o acesso facilitado aos livros mudou a postura dos alunos, já que eles têm mais tempo para ler e podem trocar livros. 

Impactado certeiro na autoestima das crianças

“Felizmente, uma educação antirracista é contagiante. Todas as crianças são apresentadas a novas perspectivas sobre a cultura e a história do Brasil, aprendem mais sobre a África e recebem mais informações para romper com as visões racistas. No caso das crianças negras, o resgate da autoestima é imediato”, comenta a professora Anamô.

Essa inserção no mundo da literatura a partir de referências que façam sentido para as crianças tem refletiu no gosto dessas crianças pela leitura e pela vontade de permanecer na escola. “A gente tem observado que elas têm paixão pelos livros, já que se veem representadas ali, têm orgulho do espaço na qual estão inseridas. Elas pisam no chão da nossa escola e se sentem parte daquilo, sentem tão capazes quanto qualquer outra criança, se sentem bonitas. Isso muda tudo, a postura corporal, comportamento, até o rostinho deles se modificam”, diz a docente.

Novos formatos

O projeto se expandiu nos últimos anos e virou evento literário, o Festival Lê Comigo, que convida autores de literatura infantil e afro-brasileira, contadores de histórias e artistas de outras áreas para a escola. A proposta é potencializar as atividades realizadas na sala de leitura, oferecendo às crianças um portfólio literário maior e novos formatos de aprendizagem.

Desde 2020, com as aulas acontecendo no formato remoto, tanto as ações do festival  quanto as atividades da sala de leitura estão ocorrendo online. Todo o acervo de palestras, contação e leituras de histórias dos autores convidados pelo Lê Comigo estão no canal do projeto no Youtube.

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