25/09/2017|
Por Ana Luísa Vieira
Segunda etapa do projeto Pedra, Papel e Tesoura leva oficinas de educomunicação e quadrinhos a escolas da Região Sudeste, com foco no combate ao trabalho precoce.
Na ponta de uma das praias de Cabo Frio, na Região dos Lagos do Rio de Janeiro, Lucas recolhe latas de alumínio para revender. Neste mesmo cenário, permeado por água cristalina e areia branca, Marcos leva seu carrinho de picolé em direção aos turistas, debaixo de sol forte, por horas a fio.
Estas duas histórias foram criadas por estudantes do Centro Integrado de Educação Pública CIEP Hermes Barcelos e retratam a gravidade do trabalho infantil na cidade do litoral do Rio de Janeiro.
Nos dias 21 e 22 de setembro, nove alunos, de 11 a 13 anos, participaram das oficinas do Projeto Pedra, Papel e Tesoura, idealizadas pelo Canal Futura. Nesta etapa, a iniciativa conta com a parceria da Cidade Escola Aprendiz, que também desenvolve a Rede Peteca – Chega de Trabalho Infantil junto ao Ministério Público do Trabalho.
Músicas, quadrinhos, lápis de cor, brincadeiras e rodas de conversa foram os elementos usados para conscientizar os estudantes sobre os malefícios do trabalho precoce e o papel da escola e da rede de proteção na garantia dos direitos de crianças e adolescentes.
Conscientização e educomunicação
“O menino que catava latinhas” e “Marcos e o seu carrinho de picolé” foram os nomes escolhidos pelos alunos para as histórias que criaram durante os dois dias da oficina. Os desenhos feitos pela turma farão parte do Kit Pedra, Papel e Tesoura e serão transformados em gibi e animação pela equipe do Futura.
Uma cartilha com orientações pedagógicas e dados sobre trabalho infantil analisados pelos principais especialistas da área também vão compor o material, que, no início de 2018, será distribuído a escolas e alunos da rede pública.
Orientados pelos educomunicadores Paulo Emilio Pucci e Fabiana Cecy, os meninos e meninas não tiraram os olhos da oficina, conduzida de forma lúdica com o intuito de estimular a participação das crianças. “Mas como o meu desenho vai virar animação na internet? É mágica?”, perguntou o estudante Gabriel de Souza, de 13 anos.
A resposta veio com a apresentação das animações desenvolvidas durante a primeira etapa do projeto, realizada no Nordeste. Os vídeos estão disponíveis no YouTube:
A importância da mobilização
Ao Aprendiz, coube a tarefa de apresentar aos estudantes quais os profissionais responsáveis por evitar que crianças e adolescentes sejam submetidos à situação de trabalho.
“Não sabia que a tia Robiniza Martins era conselheira tutelar e o que ela fazia”, contou a aluna Joyce Souza, de 12 anos, ao ver a foto da profissional em um slide. “Achava que o conselheiro tutelar só brigava com as crianças”, admitiu a também aluna Letícia Martins, de 11 anos.
“Olha só, minha tia é assistente social e trabalha no CRAS (Centro de Referência e Assistência Social). Vou contar pra ela o que aprendi aqui. Tem muita criança que trabalha, mas isso não é bom”, concluiu Marciely Ribeiro, de 11 anos, após uma conversa sobre os mitos que rodeiam o trabalho precoce.
A segunda etapa do Projeto Pedra, Papel e Tesoura vai contemplar, além do Rio de Janeiro, os estados de Minas Gerais e São Paulo. As escolas e territórios foram indicados pelo Fórum de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil e pelas secretarias estaduais de educação.
A ideia, nesta fase, é visitar escolas em diferentes contextos – litorâneo (Cabo Frio-RJ), rural (Setubinha-MG) e urbano (São Paulo) – a fim de mostrar como as crianças enxergam e enfrentam a vulnerabilidade em suas regiões. Acompanhe a cobertura.
Trabalho infantil no Sudeste
A Região Sudeste responde sozinha por 854 mil crianças e adolescentes em situação de trabalho. Ou seja, um em cada três casos (32,8%) ocorre nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Só no Rio, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (IBGE) de 2015, existem atualmente 71.262 crianças e adolescentes de 5 a 17 anos em situação de trabalho.
Os quatro estados assumem protagonismo ainda mais preocupante quando o critério são as cidades com maior incidência de trabalho infantil. Dos 957 municípios com maior prevalência da atividade laboral precoce acompanhados pelo Sistema de Monitoramento do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (SIMPETI), 377 (40%) estão na Região Sudeste.
Por meio da ferramenta do Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA), essas prefeituras repassaram dados sobre o trabalho infantil, com base no Censo 2010, e receberam acesso a repasses federais para desenvolver ações específicas para essa população. Cabo Frio, Setubinha e a região metropolitana de São Paulo, territórios contemplados pelo Projeto Pedra, Papel e Tesoura, fazem parte do SIMPETI.