08/12/2017|
Por Cecilia Garcia
Associação Conpoema apresentou resultados da campanha de sensibilização realizada desde setembro deste ano.
Dezembro é mês de balanços fiscais em todo o país. No último dia 4 (segunda-feira), aconteceu a audiência pública de prestação de contas do Programa de Erradicação de Trabalho Infantil (PETI) em Francisco Morato (SP).
Depois de três meses de trabalho de conscientização, a Associação Cultural Conpoema, responsável pela campanha de sensibilização do programa, apresentou a uma plateia de servidores públicos, assistentes sociais e interessados no tema os resultados atingidos tantos nas campanhas de marketing como nas formações presenciais. O evento ocorreu na Câmara Municipal da cidade.
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Como Elisângela Costa Lima, assistente social do Conpoema, deixou claro, apresentar os resultados obtidos durante os meses de trabalho não significa que o projeto tenha terminado. Pelo contrário: é somente a primeira parte da execução de um plano que visa erradicar o trabalho infantil no município, apoiado pela Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social – SMADS.
“Foram 378 locais visitados pela ação do PETI em Francisco Morato, e nós conhecemos não somente uma cidade nova, como também profissionais que nunca conheceram a fundo o trabalho infantil e queriam aprender. Nossa intenção era e sempre será o trabalho em rede”, explicou a assistente.
O secretário de Assistência Social Wagner Santana foi um dos primeiros a tomar a palavra, ressaltando a importância da consolidação dessa rede para cuidar dos casos de baixa, média e alta complexidade dentro do município. Mas também dividiu com a plateia as dificuldades previstas para 2018: “Será um ano de retrocessos, e também o momento de lutar intensamente por políticas públicas”. Ele olha com preocupação o corte previsto no orçamento de assistência social em 2018.
Roda de conversa
Foram convidados também parceiros que lutam pelos direitos das crianças e adolescentes no município. Valério Ortiz apresentou a associação Pró-Morato, que já impactou 2.193 jovens ao inseri-los na Lei do Aprendiz (10.097/2000). “Isso é especialmente importante em Francisco Morato; por ser uma cidade dormitório, sempre teve dificuldades complexas em ofertas de emprego”, ressaltou a coordenadora.
Também falou Julieta de Castro, coordenadora do Centro de Referência da Mulher da cidade. “De quem é a família moratense, de quem são as crianças que ainda são vítimas de trabalho infantil? São nossas. O trabalho infantil tem de ser uma responsabilidade de toda rede, não só do conselho tutelar ou da assistência social”.
O desafio: acabar com os mitos sobre o trabalho infantil
Foram 11 as formações oferecidas pelo PETI 2017 e pela Associação Conpoema. Elas aconteceram dentro de espaços de assistência social, escolas e associações. Ainda que tenha sido rico o contato com os agentes de proteção do direito à infância e adolescência, Elisângela não tem dúvidas que a maior riqueza dos encontros foi a oportunidade de ouvir as crianças e adolescentes.
Ainda que acanhados em falar de suas experiências, eles não puseram dúvidas que a realidade do trabalho infantil persiste. Segundo último censo da região, lançado pelo IBGE nos idos de 2010, foram notificados 985 casos de trabalho infantil.
Encontro de Capacitação PETI 2017 – ETEC Francisco Morato – 24/10/2017
Posted by Associação Cultural Conpoema on Thursday, December 7, 2017
Dos 300 entrevistados – cujas idades foram resguardadas – ouvidos nas formações, 46 já manifestaram ter trabalhado. Cinco disseram estar trabalhando atualmente. Os outros que preferiram não falar revelam a dificuldade de enxergar a violação, porque com frequência diziam que, embora não trabalhassem, conheciam amigos que o faziam. “Isso mostra que os números estão subnotificados e muitas das violências, invisíveis”, relata a assistente.
Dos cinco jovens que manifestaram ainda estar trabalhando, duas são babás e os outros três são atendentes em padarias, pizzarias e lava-rápidos. Já as ocupações dos jovens que dizem ter trabalhado variam entre cabeleireira, cuidador de cavalo, ajudante em construção ou em metalúrgica.
Vale a lembrança de que muitas das profissões estão dentro da Lista de Piores Formas de Trabalho Infantil (TIP), causando sérios danos físicos e psicológicos as suas vítimas. Um dos jovens, atendente de sorveteria, relatou já ter ficado em pé durante seis horas, sem possibilidade de fazer refeições ou ir ao banheiro.
A voz de quem atua
Elisângela conta que durante muitas das formações ela escutou frases como “Por que vocês estão incentivando os jovens a deixar de trabalhar?’ ou ‘Por que querem que eles fiquem desocupados?”. São mitos ainda persistentes, até dentro de espaços de assistência, e é necessário que o trabalho de sensibilização se mantenha.
Mariana Marques compartilhou dados referentes à campanha de marketing promovida nos três meses de trabalho do PETI: foram mais 60 mil pessoas atingidas presencial ou online pela publicidade, que incluía não somente produção midiática em redes sociais como também ocupação de outdoors espalhados pela cidade.
Por ser feita inteiramente em Creative Commons – licença que permite o uso não comercial de uma mídia – a campanha foi utilizada por escolas da região e também em outras cidades do Brasil, como em Sátiro Dias (BA).
Compromisso com a intersetorialidade
Após a apresentação dos resultados, os convidados puderam compartilhar suas dúvidas e experiências no combate às violações de direito da criança, na esperança de sair da audiência pública com a proposta de criação de uma comissão da intersetorialidade.
Um dos relatos em comum entre as organizações foi a necessidade de lutar contra a naturalização de determinadas formas de trabalho infantil, principalmente o doméstico. O número expressivo de denúncias, até em casos de jovens com deficiência, tem preocupado Valéria da associação Pró-Morato. Uma das alternativas debatidas foi a necessidade de lutar pelo contraturno escolar.
A prefeita Renata Sene fez as falas finais, sinalizando a necessidade de trabalho em rede e compartilhamento de informações. “Uma administração pública deve estar atenta para o coletivo e ter olhar para o humano. Estamos contentes em perceber que as secretarias e as associações envolvidas tem muito claro à importância de dar atenção ao combate ao trabalho infantil. O que não podemos fazer é guardar conhecimento. Tudo que for feito de boas ações deve ser compartilhado em rede. Só assim poderemos erradicar o trabalho precoce.”