Livro reúne experiências sobre a importância de ouvir e dar voz às crianças

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21/11/2016|

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“A criança não pensa nem melhor nem pior que o adulto; ela pensa de modo diferente. A nossa maneira de pensar é feita de imagens um pouco apagadas e de sentimentos empoeirados. A criança pensa com seus sentimentos, não com sua inteligência. Isso dificulta a nossa comunicação com ela e não há, provavelmente, arte mais difícil que a de falar com as crianças…” Janusz Korczak, no livro “Como Amar uma Criança”.

A frase acima, do escritor e médico pediatra Janusz Korczak (1878-1942), nos estimula a refletir sobre o modo como nos relacionamos com as crianças. Saber ouvi-las, observá-las e incentivá-las a se manifestar, como sujeitos plenos de direitos, é justamente a proposta do livro “Quem está na escuta? – Diálogos, reflexões e trocas de especialistas que dão vez e voz às crianças”.

Lançado no final de outubro, inicialmente em formato digital, o material foi produzido pelo Mapa da Infância Brasileira (MIB), referência na área de estudos da infância e do brincar no país. São 63 páginas com artigos e entrevistas de pesquisadores de áreas distintas, que refletem sobre a importância do cuidar.

Com leitura leve e experiências didáticas e inspiradoras, a publicação é voltada a educadores, atores da rede de proteção e demais interessados nas questões da infância.

“Acredito que, para abrirmos canais para ouvir as crianças, nós adultos, pais, educadores e cuidadores em geral, devemos começar por resgatar nossas memórias de infância”, diz Adriana Friedmann, idealizadora e coordenadora do MIB, em entrevista à Rede Peteca – Chega de Trabalho Infantil. Confira a íntegra da conversa:

Em um dos trechos do livro, a senhora escreve que “escutar as crianças é como fazer uma viagem ao território da infância”. Em que ponto se iniciou a viagem, a ideia do projeto? 

Adriana Friedmann: Trabalho com pesquisa e formação na área da infância desde os anos 1980. Sempre com educadores das áreas formais e não formais. Com o passar do tempo, após muitas iniciativas especificamente voltadas para promover e conscientizar da importância do resgate do brincar na vida das crianças, orientação e promoção de criação de espaços lúdicos, surgiu a pergunta: mas quem de verdade escuta as crianças?

Adriana Friedmann, idealizadora e coordenadora do Mapa da Infância Brasileira. Crédito: Arquivo Pessoal

Adriana Friedmann, idealizadora e coordenadora do Mapa da Infância Brasileira. Crédito: Arquivo Pessoal

A partir de contínuos processos de formação desenvolvidos no decorrer dos anos e de novos projetos de escuta de crianças desenvolvidos dentro do Mapa da Infância Brasileira, surgiu a ideia de compilarmos na publicação ‘Quem está na escuta’ reflexões de pensadores e ativistas da infância, assim como o relato de experiências de escuta em várias partes do mundo. Assim, no início de 2000, mergulhei nos estudos da Antropologia da Infância e comecei – junto com minhas pesquisas e tese de doutorado – a desenvolver vários cursos de formação na área e pesquisas com crianças.

Tenho acompanhado ao longo dos últimos anos inúmeros pesquisadores e incentivado tantos outros a desenvolver seus processos de escuta, colocando a importância de dar especial atenção ao cuidado, ética e respeito ao adentrar os territórios infantis.

Capa do livro digital “Quem está na escuta? – Diálogos, reflexões e trocas de especialistas que dão vez e voz às crianças”. (Crédito: Reprodução)

Capa do livro digital “Quem está na escuta? – Diálogos, reflexões e trocas de especialistas que dão vez e voz às crianças”. (Crédito: Reprodução)

E quais foram as principais descobertas dessa viagem?

Adriana Friedmann: A principal descoberta, diria, foi que, embora tenhamos tantas áreas de conhecimento debruçadas na compreensão das crianças e de suas infâncias; embora inúmeras iniciativas tenham surgido nos últimos 20 anos priorizando as crianças; embora tenhamos um acervo de produções e conhecimentos a respeito deste período tão importante da vida; muito pouco conhecemos das realidades e das diversidades dos grupos infantis na atualidade.

Em recente reportagem, o Portal Aprendiz elencou uma série de dicas para o processo de escuta de meninos e meninas. Clique para ler a matéria.

Aprendemos o quanto as crianças dizem e se expressam quando têm tempo e espaços para o brincar livre; que elas se revelam quando pintam, desenham, dançam, escrevem, falam; quando escolhem com quem, onde, quando e com o que desejam brincar – ou não brincar. O quanto suas doenças físicas ou psíquicas vêm revelando o que elas vivem, sentem e desejam. Porém, o caminho sobre o conhecimento dos seus universos está apenas começando!

Em sua opinião, como estimular pais e educadores a ouvir a voz da infância?

Adriana Friedmann: Acredito que, para abrirmos canais para ouvir as crianças, nós adultos, pais, educadores e cuidadores em geral, devemos começar por resgatar nossas memórias de infância. Este exercício é o primeiro passo para que o adulto possa ‘ouvir’ as vozes infantis. Na sequência, ao adquirirmos consciência da importância que os diversos episódios da nossa infância tiveram na nossa vida, começamos a entender por que dar estes espaços de voz é tão importante para as crianças e para quem acompanha suas infâncias.

Como isso deve ser feito?

Adriana Friedmann: Deixando- as brincarem livremente, escolherem atividades oferecidas, introduzindo diversas possibilidades lúdicas, de movimento, de contato com outras crianças, adultos, espaços e materiais diversos; contato com artes, músicas, atividades lúdicas adequadas; e possibilidade de explorarem, descobrirem suas preferências e suas limitações. É fundamental o adulto se colocar como observador-aprendiz e ‘pedir licença’.

Assista, abaixo, ao vídeo institucional do Mapa da Infância Brasileira.

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