25/09/2020|
Por Bruna Ribeiro
Uma pesquisa realizada pela Plan International com 7 mil jovens de 14 países, incluindo o Brasil, revelou que nove em cada dez meninas (88%) dizem que estão sentindo altos ou médios níveis de ansiedade como consequência da pandemia de coronavírus. O levantamento Vidas Interrompidas: O Impacto da COVID-19 na vida de Meninas e Jovens Mulheres ainda mostrou que um dos motivos para tal condição é o trabalho infantil doméstico.
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“Minha preocupação é como posso evitar que o coronavírus afete a mim e a minha família. Além disso, por causa desse vírus, eu passo o dia inteiro em casa. Eu não gosto de ficar aqui, porque sou a única que faz todo o trabalho doméstico desde quando acordo até a hora de dormir”, diz Emma, de 14 anos, de Gana.
Para Deolinda, de 19 anos, de Moçambique, o isolamento social com lockdown, e não apenas o vírus, teve maior impacto sobre ela e sua família. “Nos disseram que, para evitar a infecção por COVID-19 devemos ficar em casa e não ir à escola ou ao trabalho. Isso torna as coisas muito difíceis para mim, porque eu conto com pequenos trabalhos por aqui. É assim que sustento minha família”.
No Brasil, as meninas também relataram dificuldade de acesso à internet. “Alguns dos meus amigos e amigas sugeriram sites para me ajudar nos estudos, mas não tive nenhum resultado e nem sempre tenho um acesso bom à internet. A verdade é que também estou muito desanimada. Eu não acho que seja a única que se sente assim”, diz Deborah, de 18 anos, que está pensando em abandonar a escola por causa da pandemia. Ela vive no Piauí.
Carga econômica, doméstica e emocional
Para Isobel Fergus, Gerente de Pesquisa da Plan International, meninas e jovens mulheres estão aguentando uma carga econômica, doméstica e emocional maior durante a pandemia, trabalhando mais do que nunca. “Elas nos contaram sobre as tensões em casa, como se sentem sozinhas, sobre as faltas na escola, dos amigos e de liberdade de sair por aí. Todos estes são componentes cruciais para o desenvolvimento acadêmico, social e pessoal de uma pessoa jovem”, diz Isobel.
Ainda segundo a gerente, vai ser muito difícil recuperar esse tempo perdido e a exclusão digital significa que as meninas, especialmente em países de baixa renda, terão dificuldade em acessar as informações de que precisam para sua educação e saúde. As oportunidades pelas quais tanto lutamos estão desaparecendo.
Mais sobre a pesquisa
Para as meninas entrevistadas, com idades entre 15 e 19 anos, os medos mais prevalentes dizem respeito à sua própria saúde (33%) e ao bem-estar de suas famílias (40%). Quase um terço delas (26%) estava preocupada com a perda de renda familiar devido à pandemia. O Brasil foi um dos países onde as meninas afirmaram sofrer com mais ansiedade.
Para Cynthia Betti, Diretora-executiva da Plan International Brasil, é preciso diminuir a exclusão digital, considerar o acesso a direitos sexuais e direitos reprodutivos como serviços essenciais que não podem ser descontinuados, nem durante uma pandemia, assim como serviços de proteção contra a violência baseada em gênero. “Também precisamos fornecer apoio psicológico e cuidar do retorno destas meninas e adolescentes à escola, combatendo a enorme evasão que estamos prevendo. Escutamos as vozes de mais de 7 mil meninas em 14 países. Agora é nossa vez de agir, com elas e para elas”, complementa.
Segundo Anne-Birgitte Albrectsen, CEO da Plan International, a pesquisa é um alerta para que os governos reconheçam que as emergências de saúde afetam os grupos de formas diferentes e o impacto potencialmente devastador das consequências disso a longo prazo, que serão sofridas pelas meninas.
“Para as meninas, os riscos de ficar em casa são maiores. Esta situação afeta sua saúde mental e as coloca em risco de violência doméstica. Por causa das normas sociais patriarcais, que ditam que as meninas devem assumir a grande maioria do trabalho doméstico não remunerado, existe uma ameaça real de que elas sejam obrigadas a abandonar a escola e que fiquem sem estudar”, complementa.