Escola em Heliópolis desenvolve projetos para evitar exclusão escolar e combater trabalho infantil

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24/03/2022|

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No retorno às aulas presenciais, nem tudo voltou a ser como antes na Emef Dr. Abrão Huck, em Heliópolis, na Zona Sul de São Paulo. Isso porque alguns alunos não retornaram e outros precisaram passar por atendimentos ligados à saúde mental e à vulnerabilidade social. Um dos casos foi o de *Carolina, que chegava todos os dias atrasada, pois precisava levar o irmão mais novo à creche. O jeito foi conversar com a família, para que a menina não precisasse sair da escola.

A percepção da diretora Claziane Pereira de Lima foi de que o trabalho infantil, incluindo o doméstico, aumentou com a pandemia, assim como a exclusão escolar e a queda no rendimento. Como resposta, a escola criou o projeto Recuperação das Aprendizagens, voltado para estudantes dos 7º, 8º e 9º anos. São oferecidas aulas extras de língua portuguesa, matemática, ciências humanas, ciências naturais e educomunicação.

“Os alunos ficam na escola das 12h às 13h30, após o término da aula. Os participantes do programa são selecionados pela vulnerabilidade social e pela dificuldade de aprendizagem. Fica quem precisa mais. Para isso, fizemos uma avaliação diagnóstica das cinco turmas. A ideia é garantir o desenvolvimento das habilidades perdidas durante a pandemia”, explica.

O objetivo da diretora é trazer as famílias para dentro da escola por meio das crianças. “Na medida em que a criança gosta desse espaço e é atraída por projetos, a família acaba sendo pressionada a trazer.

Exclusão escolar

Atualmente, a escola divide os alunos em três categorias: totalmente ausentes, “turistas” e frequentes. “O nosso trabalho agora é fazer com que os ‘turistas’ se tornem frequentes”, explica Claziane. Turistas são aqueles que faltam muito, mas frequentam a escola.

Ao todo, são 938 matriculados na unidade, divididas em turmas de 30 a 32 estudantes. Segundo Claziane, em cada turma, há cerca de cinco a sete alunos “turistas” e de dois a quatro ausentes. No caso dos ausentes, a escola busca contato com a família. Caso não consiga, é preciso registrar o não comparecimento à Secretaria de Educação.

“Essas famílias perdem as vagas e precisam realizar novos cadastros. A vaga pode sair na mesma escola ou em outra. O ideal seria termos uma orientadora com foco em assistência social para realizar a busca ativa de crianças e adolescentes ausentes, mas não temos esse recurso. Há situações em que a família está viajando ou teve problemas pontuais e conseguimos contornar. Mas há situações em que realmente perdemos o contato”, explica.

Atuação em rede

Para suprir as necessidades da escola, Claziane costuma acionar a rede de proteção do bairro, como Conselho Tutelar, Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas) e Unidades Básicas de Saúde (UBS).

“As vezes precisamos pedir auxílio psicológico para os alunos ou apoio em casos de violência doméstica. Também temos solicitado muitas vagas no Centro para Crianças e Adolescentes (CCA) aqui perto. As atividades no contraturno escolar ajudam muito no enfrentamento ao trabalho infantil e protegem as crianças do contato intenso com o tráfico de drogas”, explica.

A diretora ressalta a importância da intersetorialidade em Heliópolis. “Recentemente nós recebemos um aluno diabético, que faz uso de insulina. Liguei diretamente para o hospital da comunidade para agendar uma consulta, pois eu não conseguiria pedir a dieta adequada à Secretaria, sem a prescrição da nutricionista. Conseguimos adiantar a consulta com esse argumento e recebemos o garoto”, exemplifica Claziane.

Com tudo isso, o objetivo da diretora é reduzir a exclusão escolar e violências como o trabalho infantil. “A gente luta para os alunos não saírem da escola. Buscamos sempre fazer um acompanhamento e rastreamento das situações em que as crianças são expostas a algum tipo de violência. ”

Educação antirracista

Além da realização de projetos e da atuação em rede, Claziane entende que a educação antirracista tem um importante papel no enfrentamento à exclusão escolar. “A educação antirracista e todas as proposições trazidas pela Lei 10639 são importantíssimas, pois balizam o trabalho de cada educador e educadora em sala, levando-os a reflexões que impactam nas aulas ofertadas e na forma e lidar com os conflitos ali presentes”, diz.

“Em nossa escola, buscamos a resolução de conflitos com a chamada Roda de Conversa, espaço onde as crianças e jovens podem se colocar e ter o seu momento de fala e escuta garantidos, para que não continuemos a passar por cima de problemas e angústias que surgem e que tantas vezes estão ligados ao racismo. Nos projetos, as crianças e jovens são estimulados a perceberem as aprendizagens já adquiridas, caminhando e construindo novos processos de desenvolvimento”, completa.

Como implementar na sua escola

Cada escola e cada comunidade escolar apresenta necessidades e caminhos próprios, adequados ao seu contexto, mas convidamos Claziane a compartilhar conosco o passo-a-passo dos inspiradores projetos desenvolvidos na escola:

Recuperação das Aprendizagens

  • Primeiro mobilizamos os professores de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências Humanas, Ciências Naturais e Educomunicação.
  • Os estudantes ficam conosco todos os dias de segunda a sexta após a aula e recebem a oportunidade de revisar e aprender conteúdos que foram esquecidos ou não foram bem aprendidos durante a pandemia.
  • Esses professores têm a oportunidade de fazer o seu momento de estudo – o horário coletivo – em um dos nossos outros horários (das 10h30 às 12h ou das 13h30 às 15h) e isso é fundamental, pois o educador não é prejudicado por estar com essas aulas, pelo contrário – muitos conseguiram atingir as 25 horas/ aula e compor jornada (portanto recebem por 10 horas/aula a mais para estudo).

Atuação em rede para enfrentamento da exclusão escolar

  • As ações são desenvolvidas junto aos educadores e educadoras.
  • É realizado um levantamento a cada 15 dias para verificar os estudantes que estão totalmente ausentes ou que apresentam muitas faltas.
  • A partir desse levantamento, entramos em contato com as famílias por telefone e/ou redes sociais.
  • Em alguns casos, tentamos localizá-los junto aos CCA´s do território.
  • Caso não localizemos, os nomes são enviados ao Conselho Tutelar para que essas crianças sejam localizadas e voltem para a escola.

Roda de conversa

  • A roda de conversa é realizada quando ocorre algum conflito ou incômodo, como atitudes de colegas e até de professores.
  • Os alunos são convidados a expor e argumentar a respeito da situação em questão.
  • Por meio do diálogo, é objetivada a resolução de conflitos.

 

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