Guia de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil é lançado em São Paulo

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10/06/2019|

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Foto: Tiago Queiroz

Iniciando as celebrações da semana do Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil (12 de junho), o Projeto Chega de Trabalho Infantil lançou na manhã desta segunda (10) o Guia Passa a Passo: Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil na cidade de São Paulo, em um evento na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP).

O livro é fruto do projeto Chega de Trabalho Infantil, realizado pela Cidade Escola Aprendiz com apoio do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fumcad). O lançamento foi acompanhado de um debate aberto ao público sobre os principais desafios para o enfrentamento do trabalho infantil na cidade de São Paulo.

Participaram da mesa o gestor da Rede Peteca Felipe Tau, a autora do guia e socióloga Luciana Silveira, a procuradora do Trabalho (MPT-SP) Elisiane dos Santos e  a Coordenadora do curso de Sociologia e Política da FESPSP Carla Regina Mota Alonso Diéguez.

A versão online do Guia Passo a Passo será lançada no Dia 12 de Junho – Dia Mundial de Combate ao Trabalho Infantil. Inscreva-se em nossa newsletter para recebê-la!

Como foi o debate

Para Felipe Tau, a agenda do trabalho infantil precisa ser reconhecida pela sociedade em toda a sua gravidade. E o trabalho jornalístico, aliado à pesquisa-ação, é um instrumento fundamental para que isso aconteça. “É preciso deixar claro do que estamos falando ao tratar do trabalho infantil: uma violação grave de direitos humanos. Em nosso trabalho, o jornalismo apoia a pesquisa de campo, e o campo apoia o jornalismo”, diz o gestor.

A autora Luciana Silveira ressaltou que o trabalho infantil é uma herança e leva até quatro gerações para que essa cultura seja rompida nas famílias. “Além da conscientização, a ruptura passa também pela estabilidade econômica e pela renda”, explica.

“Muitas vezes a criança pedindo ou vendendo passa a fazer parte da paisagem urbana. Há de se pensar nas razões que levam as pessoas a reproduzirem os mitos do trabalho infantil. Será que é apenas comodismo ou será que há uma descrença da efetividade da política pública?”, questiona a especialista.

Foto: Tiago Queiroz

A respeito das portas de saída para a violação, a professora Carla Regina Mota Alonso Diéguez sugeriu que a educação é um dos caminhos, mas não é o único. “Precisamos combater a desigualdade e os mitos culturais. Além de ilegal, o trabalho infantil é indigno. Não é decente.”

Após falar sobre os retrocessos na atual conjuntura política, como a extinção do Ministério do Trabalho, a procuradora do trabalho Elisiane Santos ressaltou as consequências da escravidão e do racismo, uma vez que a maioria das crianças vítimas dessa violação são negras e  estão em vulnerabilidade social.

“A cultura do trabalho infantil é para quem? Se pegarmos os dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), vamos ver que a idade média de ingresso no trabalho é de 20 a 25 anos. Então não é uma cultura. É um mecanismo reproduzido para os adolescentes da classe trabalhadora, com o convencimento de que é positivo começar a trabalhar logo. Não é realizado um convencimento sobre a importância da educação ou outros valores”, conclui a procuradora.

Após a finalização das falas, os participantes foram convidados a compartilhar ideias e fazer perguntas.

Sobre o guia

guia de prevenção e erradicação do trabalho infantil

Com gráficos, tabelas, glossário, lista de boas práticas, mapas, telefones e links para reportagens da plataforma Rede Peteca, frente de trabalho infantil da Cidade Escola Aprendiz, a publicação tem como objetivo ser uma referência para os profissionais da área, mantendo-se acessível também a todos os interessados, como jornalistas e a sociedade civil em geral. Seu foco é permitir o monitoramento e o controle social sobre as piores formas de trabalho infantil, definida pela Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e ratificada pelo governo brasileiro.

Produzido ao longo de um ano, o guia teve como território focal o Jardim Ângela, distrito na zona sul de São Paulo em que se concentram as atividades do projeto (campanhas, formações, reportagens, entre outras). Ele foi escolhido por estar entre as regiões com maior situação de vulnerabilidade social da capital, sendo também uma das mais populosas.

Seus moradores e profissionais da rede de proteção da criança e do adolescente – técnicos do Serviço Especializado em Abordagem Social (SEAS), agentes comunitários de saúde, educadores, conselheiros tutelares, entre outros – foram ouvidos em diversas entrevistas e acompanhados em seu dia a dia. Como resultado, a pesquisa de campo e a publicação espelha suas sugestões, dúvidas e desafios.

Também foram consideradas na produção do material as questões levantadas nos principais espaços de discussão ligados ao tema, como o Fórum Paulista de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FPPETI), a Comissão Estadual de Erradicação do Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente Trabalhador, a Comissão Municipal de Erradicação do Trabalho Infantil (Cometi) e o Conselho Municipal da Criança e do Adolescente (CMDCA), que apoia o projeto Chega de Trabalho Infantil por meio do Fundo Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente (FUMCAD).

Trabalho Infantil em São Paulo

A abordagem adotada para produção do material revela a necessidade de atuação intersetorial e do conhecimento da realidade diante da complexidade do trabalho precoce e do trabalho adolescente desprotegido, violações de direitos humanos que têm raízes profundas, como pobreza estrutural e aceitação cultural. São Paulo, a cidade mais rica e populosa do país, exemplifica o desafio assumido pelo Brasil ao se comprometer com a erradicação de todas as formas de trabalho infantil até 2025, uma das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Organização das Nações Unidas (ONU).

Mesmo contando com uma das maiores redes socioassistenciais da América Latina, a capital paulista possuía, de acordo com o Censo de 2010, 330 mil pessoas vivendo em extrema pobreza, das quais 125 mil eram crianças e adolescentes.

Embora não haja dados oficiais recentes, a cidade tinha, ainda de acordo com o Censo de 2010, último levantamento do gênero, 87 mil pessoas de 10 a 17 anos em situação de trabalho infantil, ou 4,6% de sua população dessa faixa etária. Considerando toda a região metropolitana, composta por 39 municípios, e a faixa etária de 5 a 17 anos, o número salta para 197.850 crianças, segundo dados divulgados pelo IBGE na PNAD de 2015.

As médias e grandes empresas da capital, por sua vez, não cumprem nem 50% da cota obrigatória de contratações de aprendizes. Com isso, deixam de atender mais de 50 mil adolescentes a partir de 14 anos, que poderiam estar empregados de forma protegida e frequentando a escola, em vez de se arriscarem nas ruas fazendo bicos ou entrando para o tráfico – piores formas de trabalho infantil comuns na cidade.

Esse cenário representa um enorme desafio para erradicar o trabalho infantil no país, com uma série de consequências para crianças e adolescentes: evasão escolar, abusos, acidentes e diversas outras violações. Por esse motivo, a difusão de conhecimento e a busca de efetividade das políticas públicas são essenciais. A sociedade e o Estado precisam se apressar em apresentar soluções, porque a demora diante de um problema tão grave pode significar a perda da infância de milhões de crianças brasileiras.

 

Formações sobre trabalho infantil começam no Jardim Ângela

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